09/04/2020

Universidade do WhatsApp formou milhões de especialistas em cloroquina

Por Leonardo Sakamoto - Colunista do UOL

Não sou profissional ou pesquisador da área de saúde, portanto não tenho competência para falar da efetividade da cloroquina no tratamento do coronavírus. Há médicos que, analisando caso a caso, e sabendo dos riscos do uso de uma droga antiga, mas em fase de testes para uma doença nova, resolvem ministrá-la, acompanhando o paciente e se responsabilizando pelos efeitos em sua saúde. Há outros que avaliam que não há provas de que ela seja mais eficaz do que o próprio sistema imunológico do paciente e traz riscos que não valem a pena, preferindo não usá-la. Eu, que sou leigo, não tenho como opinar.

Mas, espero com atenção, estudos conclusivos que confirmem a capacidade do remédio de agir contra o coronavírus. A sociedade deve estar informada sobre as pesquisas que subsidiam a adoção de política públicas que distribuem produtos químicos em larga escala - políticas que devem ser baseadas em testes e pesquisas. E, para além da cloroquina, há uma série de drogas que vêm sendo estudadas contra a doença. Quero que me provem qual delas tem mais eficácia.

Enquanto isso, mandatários, dos mais diferentes matizes ideológicos, da esquerda à direita, também deveriam se conter ao invés de usar o remédio para fins eleitorais.

Como escrevi aqui ontem, Jair Bolsonaro usou o pronunciamento à nação, desta quarta (8), para dizer que é apenas o uso da cloroquina e não o isolamento social que vai evitar mortes. Quer levar o mérito dos resultados positivos da quarentena de governadores e prefeitos para o seu colo, apontando que o efeito do segundo foi causado pelo primeiro. Um comportamento de parasita político, não de presidente da República.

Tomei cloroquina na segunda malária que peguei cobrindo conflitos armados fora do país - outra vida, um dia eu conto. Houve efeitos colaterais? Sim. Foi tranquilo? De jeito nenhum. É um medicamento e não vitaminas B e C que você pode consumir sem preocupação. Naquele momento, eu não sabia que era hipertenso e cardíaco (condições que, hoje, estão sob controle), como muitos brasileiros também não sabem.

Mesmo assim, muita gente comprou o remédio para se "precaver", em uma onda de histeria que - ironicamente - foi alimentada pelo próprio presidente, que chamou a pandemia de coronavírus de "histeria".

A automedicação é um consagrado esporte nacional, ainda mais em um momento em que a ciência se depara com um vírus novo para o qual não tem todas as respostas - mas que, decerto, não passará por jejum a Deus. E em um ambiente de alta conectividade digital, em que as pessoas acham que a imensa quantidade de informação aleatória que recebem lhes garantem graduação em Medicina pela Universidade do WhatsApp, com residência em Infectologia pelo prestigioso Hospital do Google.

Leia a íntegra do texto AQUI

Postado em 9/04/2020 às 17:36 - Foto: HeungSoon/Pixabay (comprimidos de cloroquina)

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